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psichos: FREUD EXPLICA...


...por que Filósofos Modernos (Descartes, Berkeley, Russel, Kant)
subestimaram o Solipsismo.
Há poucos problemas realmente novos na Filosofia, e o Solipsismo não é um deles, no entanto, está no rol das questões cujas abordagens até um certo período podem ser desprezadas.
É certo que os Céticos gregos antigos se depararam com o problema, sendo que o Solipsismo é nada menos que o resultado terminal de um Ceticismo radical e inegociável, ocorreu também aos medievais esbarrões no mesmo, mas ninguém, em especial estes últimos, parecem ter trazido o problema mais à tona do que DESCARTES.

Em seu Discurso do Método e em suas Meditações, Descartes promove uma viagem ao princípio fundamental da certeza, e tal como já prenunciara Agostinho, conclui pela certeza indubitável da existência de um elemento básico para toda a realidade, um substrato sensível e pensante, um Eu, ou como dizia Agostinho, uma Mente.
Usarei aqui o termo Mente como sempre faço, como um facilitador, quer seja ela um epifenômeno cerebral ou uma instância divina superior à matéria, o que importa é que podemos falar em uma Mente. Podemos também falar em um Eu, mesmo que seja ilusório, ocorre uma espécie de “Centro” essencial de nossa mente, um sujeito.
Digo então que Descartes detectou a existência de um Eu, ou de seu próprio Eu, e a existência de uma certa individualidade necessária não me parece auto questionável por qualquer mente sã que tenha entendido o argumento. Para que ninguém diga então que a Filosofia não tem certezas, esta é uma delas.
Além do Eu, estamos submetidos também a uma miríade de eventos que ocorrem a este Eu. Que é constantemente afetado por coisas que prefiro chamar de Fenômenos, antecipando já o século XIX.
Detectamos então a existência de duas coisas, do Eu, e do Fenômeno, que ao que tudo indica é gerado por um Mundo que cerca o Eu, e aqui já começam nossos problemas.
O que é este Mundo? Ele de fato existe ou é apenas uma Ilusão?
Ora, de nada adianta apelarmos aos nossos sentidos, eles são notoriamente falhos, que dizer de nossa razão, que prova apenas nossa própria existência. Um raciocínio empirista não escapa do fato de se basear nos duvidosos sentidos. O que, afinal, pode nos garantir que experienciamos algo realmente diferente de um estado de perpétuo sonho?
O mundo à nossa volta poderia ser um mero delírio onírico, uma complexa e ardilosa ilusão, produzida por um Gênio Maligno, uma Matrix, ou uma Pedra do Sonho. O próprio Descartes declara várias vezes que o fato de que somos regularmente imersos no mundo de Morfeus, nos deveria deixar ao menos relutantes em confiar de imediato na existência real de tudo que nos chega aos sentidos.
Porque nesse exato momento eu não estou sonhando? Como posso ter certeza disso?
Curiosamente, já aqui, parece cair por Terra qualquer possibilidade de superar essa dúvida por qualquer dado que nos venha por meio dos sentidos, o que inclui a experiência e o próprio método científico. Razão esta pela qual posso dizer sem hesitar que os Empiristas jamais superaram esse problema. Todo e qualquer dado que proceda dos Fenômenos, é inútil para derrubar a Barreira de Ilusão, vide aforisma eta.
Outra apelação comum, e bem mais promissora, parece ser o da racionalidade, utilizada como último recurso pelo próprio Descartes de um modo até um tanto desdenhoso. Segundo suas próprias palavras:
“E devo rejeitar agora todas as dúvidas hiperbólicas e ridículas, particularmente esta incerteza tão geral no que diz respeito ao sonho que eu não podia distinguir da vigília: pois agora encontro uma diferença muito notável no fato de que nossa memória não pode jamais ligar e juntar nossos sonhos uns com os outros e com toda a sequência de nossa vida, assim como costuma juntar as coisas que nos acontecem quando despertamos.” (Meditação Sexta, Parágrafo 42.)
Aqui Descartes já está encerrando suas meditações, apoiando esta conclusão já em sua demonstração da existência real do Mundo mediante a existência de Deus. Não obstante, essa solução não me parece superar ao menos 3 dificuldades severas:

1 - Porque essa aparente racionalidade que permite as relações causais do eventos ocorridos na Vigília, e aponta a desconexão causal dos eventos oníricos, garantiria que esta Vígilia é de fato ocorrida num mundo “Real”? Ela poderia ser apenas um nível de sonho mais denso, da mesma forma como, creio, a maioria já deve ter experimentado os curiosos sonhos dentro de sonhos.
2 - Ao menos eu, tenho com frequência experiências oníricas onde em meu sonho, não apenas estou numa situação que posso dizer completamente diferente de meu mundo real, mas também posso invocar instantaneamente qualquer memória relativa a este mundo de fantasia. Ou seja, eu me vejo num outro planeta, numa outra vida, e quando penso em qualquer aspecto dela, este me vem instantaneamente à mente, as memórias por mais longínguas que sejam ocorrem como se sempre houvessem estado lá, posso me lembrar de minha infância neste mundo, de todos os eventos, com clareza e nitidez equivalente ao de minha Vigília. Em síntese, posso sim ligar e juntar, nesse momento, coisas umas com as outras do mesmo modo como as posso juntar em um presente qualquer da Vigília.
3 - Em complemento à anterior, Descartes garante tal argumento apenas para uma operação mental que podemos fazer em um momento de nossa vigília, que é tão válido quando o que eu poderia fazer em um momento de nosso sonho, caso contrário ele ignoraria um obstáculo invencido do problema da existência, de que a garantia do Eu é meramente Instantânea, ou seja, não podemos ter nenhuma certeza de que de fato existimos no passado. Como costumo dizer, a Memória não prova a História. Poderíamos ter sido criados num segundo atrás com todas as memórias já prontas, da mesma forma como costuma me ocorrer em meus “sonhos instantâneos”.
Vale lembrar que Descartes propõe até mesmo uma existência quântica, como se o Universo fosse projetado por Deus em quantas regulares de momento, onde entre um instante e outro nada existisse. Uma analogia interessante são programas de simulação num computador. Qualquer um que jogue um bom videogame de RPG ou similares, sabe que o que conta é o tempo de execução do programa, se deixarmos de ativá-lo por anos, quando o fizermos continuaremos imediatamente após o evento anterior. A inexistência não pode ser experimentada.
Se tal descontinuidade é possível, então nada impede a criação instantânea, ou mesmo a alteração de elementos entre uma ativação existencial e outra, o que nos condena a uma inviolável incerteza com relação a nosso passado. Portanto, ser capaz de fazer conexões entre elementos de nossa vida pregressa com desenvoltura racional não demonstra qualquer realidade de nossa existência na vigília, ao menos não além da que podemos fazer durante qualquer sonho mais lúcido, do tipo dos que conseguem nos enganar.
Ademais, se tal capacidade racional fosse tão confiável para nos garantir a existência real, porque ela parece inútil para nos fazer diferenciar o sonho da realidade? Porque continuamos sonhando coisas que nos parecem tão reais, em especial quando agradáveis, e depois acordamos com aquela decepcionante sensação de que, “era apenas um sonho”? O inverso vale para o caso do pesadelo. Tal capacidade de juntar as coisas numa sequência racional só nos parece válida enquanto estamos aqui, neste aparente mundo mais racional, ou seja, é um argumento circular, ou então também é válida quando estivermos lá, no mundo dos sonhos.
E para finalizar, quem garante que realmente estamos vivendo num nível mais intenso de realidade do que quando estamos no sonho? E se, todas as noites, ao dormirmos, na verdade despertamos para uma vida muito mais lúcida e racional, esquecendo de tudo ao despertarmos? Essa é, por sinal, uma alegação comum em certas religiões espiritistas e xamânicas.
Portanto o argumento da Racionalidade embora me pareça suficiente para estabelecer uma superioridade epistemológica temporária entre um nível de existência e outro, o do mundo vigílico sobre o mundo onírico, não é ainda assim capaz de garantir a “realidade” deste mundo vigílico.
Concluo então, que Descartes se deparou com o problema do Solipsismo, mas o menosprezou, bem como TODOS os demais filósofos modernos. Em parte creio que isto se deva ao fato de que eles não consideraram um conceito que só viria a lume com Freud, o do Inconsciente, com o qual poderia perceber o quanto a possibilidade de que todos os eventos à nossa volta sejam projeções de nossa própria mente, não seja imediatamente contraditório.

Vejamos por exemplo, as conclusões de GEORGE BERKELEY ao se deparar com o problema em sua obra “Tratado sobre o conhecimento Humano”.
“29. Mas. Seja qual for o meu poder sobre os meus pensamentos, as idéias percebidas pelos sentidos não dependem por igual da minha vontade. Quando abro os olhos de dia não posso escolher se verei ou não, nem determinar os objetos particulares que se me apresentam à vista; como para o ouvido e para os outros sentidos as idéias neles impressas não são criaturas da minha vontade. Há, portanto, alguma outra vontade ou espírito que os produz.”
Berkeley pressupõe de imediato, que a fonte das impressões que nos vêem à percepção necessariamente estão fora de nós mesmos. Já é estranha tal conclusão tão precipitada visto que todos temos a experiência dos sonhos, que em momento algum é analisada nesta breve obra de Berkeley. Se olharmos porém do ponto de vista psicanalítico podemos facilmente por a pique esta afirmação, quando constatamos que nosso inconsciente pode agir como uma Vontade aparentemente externa, ou mesmo como um Espírito alheio. Mesmo hoje em dia, milhões de pessoas crêem na ação direta de espíritos e demônios para explicar ações pessoais insensatas, quando tais ações são mais apropriadamente explicadas pela Psicologia.
Mas interessante, é que mesmo a afirmação de que não “podemos escolher ver ou não”, caiu por terra já nos estudos de Freud sobre Histeria, onde abundam casos de pacientes que sobrepujam a própria percepção, como o da paciente puritana que, ao receber a notícia do falecimento do pai em um prostíbulo, e ao ser levada para reconhecer o corpo, ao se deparar com a cena que lhe era moralmente inaceitável, simplesmente ficou cega. Ou seja, sua mente se sugestionou de forma tão intensa que afetou a própria percepção.
Mesmo antes do surgimento das idéias freudianas, já era conhecimento trivial da humanidade os efeitos causados por certas substâncias alucinógenas, e hoje não mais precisamos supor a existência de fantasmas quando nos deparamos com a idéia de alucinações. E também a Hipnose pode induzir a uma subordinação dos sentidos à vontade consciente ou inconsciente.
Com tudo isso, não vejo como sustentar a opinião de Berkeley de que a constatação de que o mundo não está sob nosso controle, seja uma evidência imediata da existência de uma vontade ou mais precisamente, Espírito externo. Como ele reitera a seguir:
“146. Mas, embora muitas coisas nos convençam da sua produção por agentes humanos, ninguém ignora que as chamadas obras da natureza, isto é, a maior parte das nossas sensações e idéias, não são produzidas pela vontade humana nem dependentes dela. Há pois algum outro Espírito que as causa, visto não poderem subsistir por si (v. $29).(...)”
É evidente que ele irá levar seu raciocínio no sentido de demonstrar que o tal Espírito em questão é Deus. E é flagrante que ele aparentemente nem cogitaria a possibilidade de levar seu raciocínio no sentido contrário, no do materialismo latente de seus colegas Locke e Hume, por motivos evidentemente religiosos e subjetivos, pois um teor explícito em sua obra é a apologética religiosa e uma ofensiva contra qualquer forma de ateísmo.
Outros fizeram na verdade o exato contrário, radicalizando ainda mais e negando, se não nossa individualidade, mas nossa existência independente como mentes num mundo mental, ao afirmar que todos nós seríamos meras “Idéias na Mente Divina”, conceito que encontra eco em algumas outras doutrinas exóticas. De certa forma, nós seríamos facetas da Psique de Deus, isoladas umas das outras, e apesar desse caminho permitir a existência da Matéria, como no Panteísmo, a concepção de que cada individualidade aparente não passaria de um fragmento de uma única consciência universal, que dada a tal fragmentação resulta na ilusão do mundo físico, me parece muito mais interessante.
Mais uma vez, haveria lugar até mesmo para o Inconsciente. Talvez, nós fôssemos fragmentos da consciência perdidos na Mente da divindade, talvez nós mesmos fôssemos o próprio Inconsciente de Deus.

Mas voltando a Berkeley, vemos que ele não considerou que os eventos que nos ocorrem além de nossa própria vontade, poderiam muito bem ser gerados por nós mesmos, da mesma forma como em nossos sonhos nos ocorrem coisas contra nossa vontade. Antigamente, poderíamos muito bem considerar que tais eventos nos sonhos nos fossem impostos por outros fenômenos mais exóticos, como outros espíritos, súcubos, liliths ou o que quer que fosse, hoje podemos melhor considerá-los como elementos de nosso próprio inconsciente.
Tal possibilidade parece ter escapado a outros filósofos como BERTRAND RUSSEL, que em seu ensaio “Aparência e Realidade”, declara:
“Mas estes filósofos, embora neguem a matéria enquanto oposta à mente, admitem-na, contudo, noutro sentido. Recordemos as duas questões que fizemos: 1) Existe uma mesa real? 2) Se sim, que espécie de objeto pode ser? Ora, tanto Berkeley como Leibniz admitem que existe uma mesa real, mas Berkeley diz que ela consiste em certas idéias na mente de Deus e Leibniz diz que é uma colônia de almas. Portanto, ambos respondem pela afirmativa à primeira questão e divergem da visão das pessoas comuns apenas na resposta à segunda. Na verdade, quase todos os filósofos parecem concordar com a existência de uma mesa real; quase todos concordam que, por muito que os nossos dados dos sentidos - a cor, a forma, a lisura, etc. - possam depender de nós, a sua ocorrência é, todavia, um sinal de algo que existe independentemente de nós, algo que talvez difira completamente dos nossos dados dos sentidos e, apesar de tudo, seja olhado como a causa desses dados dos sentidos sempre que estamos numa relação apropriada com a mesa real.”
Mas como vemos, à luz do conceito de Inconsciente, é fácil refutar todas essas afirmações.
Ratificando, o Solipsismo pode ser definido como a possibilidade de que todo o mundo a nossa volta seja uma mera projeção de nossa mente, em especial de uma parte de nossa mente que não é imediatamente acessível ao Eu, da mesma forma como na Psicanálise, a maior parte do Inconsciente não o é. Como eu disse em meu texto original, o mundo Solipsíquico seria uma projeção de nosso AlterEgo, diferente de uma projeção do Ego, pois evidentemente, não controlamos todos os eventos à nossa volta, somente um Deus o faria, ou um louco acharia que o faria.
Por fim Deus, essa é a solução proposta por Berkeley e Descartes para sustentar a existência do mundo à nossa volta, e não cair no Solipsismo. Descartes garantindo um mundo físico pela bondade de um Deus Perfeito, Berkeley garantindo um mundo sensitivo pela bondade de um Deus Perfeito.
Nem pretendo aqui entrar na batida refutação que qualquer estudante de Filosofia parece capaz de fazer, da idéia cartesiana de garantir o mundo por meio de Deus, lembrando apenas de perguntar: Se Descartes só aceita idéias claras e distintas, deixando por sinal bem claro e distinto o que ele entende por isso, como ele pode ter certeza de que possui a idéia de Deus, e de sua Perfeição, se esta mesmo não é clara e distinta? Ele não poderia afirmar que entende essa Perfeição Divina tão clara e distintamente quanto entende os entes matemáticos, ou a própria percepção da Res Cogita. Quem duvida da clareza do “Penso, Logo Existo” ou dos entes matemáticos mais básicos? Por outro lado, quem consegue demonstrar a clareza da idéia de Perfeição.
Por fim, como foi reiterado pelo professor Samuel no início de nossa disciplina, a idéia de Perfeição foi estéril nos saberes humanos, já a idéia de Infinito foi bastante frutífera, e sou um flagrante delator da tensão existente entre a idéia de Perfeição e a idéia de Infinito, analisada em minha monografia DEUS ME LIVRE..
Descartes também parece não apenas comprometido com uma apologética cristã, mas até mesmo temeroso de disseminar qualquer idéia que parece ir de confronto ao Cristianismo. Acho altamente plausível a idéia de que parte de sua Filosofia tinha um mero caráter defensivo.
Por fim, mesmo que concordássemos com tudo o que ele diz, não vejo uma só razão para que um Deus perfeitamente justo e bom não criasse para nós um mundo meramente ilusório, se tal mundo agisse como um mundo real. A perfeição de Deus não garante e nem exige um mundo físico independente. E ainda por cima, levando em conta a possibilidade das criações sucessivas, que a cada instante o mundo é recriado, por que não fazê-lo com estruturas menos densas que a matéria? Como meros “sonhos”?
Já Berkeley parece excessivamente preocupado em combater o ateísmo e materialismo para se permitir sequer uma experiência de construção de uma possibilidade que dispensasse Deus. Posso imaginar várias possibilidades de remover Deus de seu sistema sem prejuízo para o mesmo.
Ao deixarmos de perceber a cadeira, porque ela precisa continuar existindo? Porque é preciso um Deus para percebê-la e garantir sua existência? Nada nos garante de que quando nenhum agente percebe a Lua, ela se fato continua lá, a existir.

Há mais de 15 anos, antes de eu ser capaz de dizer o que era Filosofia, construí uma hipótese de que o mundo era na verdade um imenso vazio, sendo progressivamente construído involuntariamente pelas consciências. Se houvesse um “local” onde ninguém jamais estivera, como uma parte de uma floresta inexplorada, ele seria um vácuo preenchido talvez apenas por uma “substância” amorfa, um caos potencial e sensível às consciências, ou mesmo por um total Não-Ser. Claro que na época eu não usava os termos desta maneira.
Assim que lá chegasse o primeiro ser consciente, este, por condicionamento, jamais esperaria encontrar um vazio, mas sim teria uma expectativa de encontrar coisas típicas da floresta, árvores, rochas, rios e similares, e então, com isso, sua mente geraria uma realidade compatível. Ou talvez suas condições mentais estivessem, num complicado jogo de disposições conscientes e inconscientes, aptas a projetar uma realidade mais exótica, talvez uma mina de ouro, ou algo fantasmagórico.
Assim que chegassem outros seres conscientes, estes tenderiam a captar à mesma realidade criada, ou se comunicar sutilmente, telepaticamente, com a mente que tivera a prioridade criadora, reforçando-a a projeção ou remodelando-a, numa cooperação inconsciente que aos poucos iria densificando a realidade.
É claro que seria preciso desenvolver bem mais a hipótese para lhe dar uma estruturação mais convincente, e na verdade até cheguei a faze-lo, mas o que interessa aqui é mostrar o quanto e fácil para um jovem pensador do final do século XX, pós Freud, imaginar coisas que pareciam mais obscuras ou demasiado improváveis a grandes mentes pré Freud, até mesmo para seus contemporâneos, como Kant.

Minha interpelação ao modo como IMMANUEL KANT se esquiva do Solipsismo é inversamente proporcional ao volume de sua obra. Podendo ser simplesmente resumida em uma só frase.
Pergunto: Se Kant afirmava que não temos nenhuma possibilidade de aceso à “Coisa em Si”, o que o faz pressupor que tal Coisa realmente existe como Objeto distinto do Sujeito?
Kant parecia tão empolgado em sua revolução copérnicana epistemológica que parece deixar escapar a possibilidade mais assombrosa. De que o Sol não apenas não girasse em torno da Terra, mas que na realidade nem sequer existisse como objeto, sendo um mero reflexo de um fogo oculto emitido pela própria Terra! Ou seja, de que os objetos não apenas não definem a percepção do sujeito, mas que estes nem sequer existem fora do sujeito, sendo meros reflexos projetados pelo próprio Eu.
Na verdade Kant chega a arriscar essa possibilidade, mas não a desenvolve. Ao invés disso concentra-se em elaborar suas complexas categorias mentais, bem como a propor os curiosos imperativos, o que me leva a afirmar que a rota de fuga kantiana do Solipsismo é simplesmente apelar para a própria Razão, ou Intuição, como o depositário de uma natureza anti solipsista. Parece ser um Juízo Analítico a Priori que o Mundo realmente exista fora de nós mesmos, ainda que encoberto pela barreira fenomênica.
Alguns pensadores hindus chamariam essa barreira de véu de Maya, e proponho uma interessante alegoria sobre ela.
Suponhamos que nossa mente seja como um centro de luz em torno do qual, muito próximos, orbitam os mais variados objetos, incluindo os dispositivos de nossa própria percepção. Estando imersa num vazio, sua luz é completamente invisível. Mas suponhamos que se erga ao seu redor uma tela de projeção, e então a Mente promoverá um autêntico teatro de sombras à sua volta.
Os objetos que ela percebe seriam meras projeções, imperfeitas, de seus próprios elementos internos. Uma espécie de Sol Platônico interno projetando sobras na Caverna fenomênica. E é claro, um tipo de Idealismo Egocêntrico.
Evidentemente teríamos que admitir uma certa realidade externa, a tela de projeção, onde tais objetos podem ser lançados, mas ela é abissalmente diferente da idéia de que haja de fato objetos reais externos à nossa mente. Pode-se recorrer a idéia de um Caos sensível, pronto a reagir à menor oscilação emanada de uma Mente.
Mas até mesmo isso pode ser descartado, e para isso, podemos apenas abusar da Navalha de Ockham.
Se pretendermos reduzir ao máximo nosso número de hipóteses, poderíamos cortar a hipótese da existência de Deus, do mundo, da matéria, das outras mentes, de nosso próprio corpo físico, e restringir todo o Universo a uma única mente, vivendo um perpétuo sonho.
Eu não concordaria se alguém interpelasse que a pressuposição de um Inconsciente seria uma hipótese adicional, mesmo porque, convenhamos, na atualidade é quase impossível conceber nossa idéia de Mente sem algo parecido.
O Universo ficaria então reduzido aos Fenômenos, e ao Eu, que na verdade os gera.

Essa seria a Teoria mais simples.

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